Inicio
este texto com um conceito do historiador cultural, Roger Chartier, para quem
as “representações não são discursos neutros: produzem estratégias e práticas
tendentes a impor uma autoridade, uma deferência, e mesmo a legitimar
escolhas.” Assim, é preciso compreender que toda representação é uma escolha,
consciente ou não.
Dito isso,
volto para uma cena que surge na minha frente diariamente. Estou aqui zapeando
pelo Facebook quando, de repente, aparece um vídeo de uma página romântica
dizendo: “o casamento mais lindo do mundo”, “a melhor declaração de amor”, “o
sim mais emocionante”.
A
construção da imagem é quase sempre a mesma: uma música romântica e linda de
fundo, uma luz quente, a noiva entrando em segundo plano e, lá na frente, um
noivo sorridente, com voz serena, lendo um texto lindo, declarando que aquela
mulher é tudo aquilo que todas nós sonhamos ser: a mulher perfeita, a
companheira ideal, a pessoa sem a qual a vida dele não teria sentido.
É tanto exagero,
é tanta mágica, que nós caímos no choro. De repente, toda a construção do amor
romântico volta à nossa mente e desejamos, profundamente, um dia estar no lugar
daquela mulher. Sentimos, é verdade, uma pontinha de inveja. O que será que ela
tem que nós não temos? Por que ela merece a perfeição e nós não?
A
declaração acaba, a noiva em lágrimas abraça o amado e o vídeo chega ao fim.
Aquela decepção por não vivermos algo assim, ao contrário, continua. Lá vamos
nós para as nossas relações reais, cheias de imperfeições. E nada basta. Nada
chega perto daquele sonho romântico e idealizado, nada chega perto de uma
representação irreal construída no nosso imaginário. Vamos nós, com nossas
inquietudes, desejando algo que inexiste e que foi alimentado por uma indústria
que lucra com isso: vender a representação de um amor pleno, perfeito e
cristalizado.
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